
Ricardo Souza Vasconcellos
Doutor em Nutrição de Cães e Gatos
FCAV - Unesp/Jaboticabal
Escolher um alimento para o cão ou gato, frente à grande quantidade de opções disponíveis no mercado, não é uma tarefa das mais simples para o proprietário. Saber conciliar o preço e qualidade no momento da compra exige conhecimento técnico por parte do profissional e do consumidor. Isto porque atualmente, o Brasíl é o segundo maior país do mundo em volume de produção de alimentos para animais de companhia, com um faturamento em 2008 de quase R$ 6 bi, equivalente a 64% do faturamento total do mercado nacional em produtos destinados a animais de estimação - que inclui, além dos alimentos, medicamentos, produtos para higiene, serviços e acessórios.
Diante destes dados numéricos, alguns podem estar se perguntanto: mas o que isto representa na prática? Em termos práticos, isto quer dizer que, à semelhança das desigualdades sócio-culturais vivenciadas por todo o país, o mercado de alimentos para animais d estimação moldou-se de acordo com a realidade nacional, ou seja, passou a produzir alimentos com preço/qualidade distintos. Desta forma, o que presenciamos é uma grande quantidade de marcas de rações com preços que oscilam entre algo em torno de R$ 1/kg até R$ 30/kg, o que certamente, é refletido na qualidade. É justamente neste ponto que o proprietário de um cão ou gato fica na dúvida sobre qual exatamente seria a diferença ente estes extremos de preço e que benefício ele teria em dar aquele alimento mais caro para seu animal, se na embalagem de todos os alimentos encontram-se os dizeres "alimento completo e balanceado" ou algo parecido.
Somente para situar melhor no tema e entender o significado da expressão "alimento completo" no Brasil,l o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, por meio da Instrução Normativa nº 30, de 5 de agosto de 2009, classifica como alimento completo aquele representado por uma "mistura composta por ingredientes, destinada exclusivametne à alimentação de animais de companhia capaz de atender integralmente as exigências nutricionais, podendo possuir propriedades específicas ou funcionais".
Ou seja, desde que o alimento atenda à exigência mínima de nutrientes para a manutenção do animal saudável, este é considerado como completo.
No entanto, nem sempre atender o mínimo e não extrapolar o máximo da exigência de um determinado nutriente na alimentação garante o melhor para o animal e, visando a isto, à medida que se melhora a qualidade de ingredientes, trabalhando também com níveis de nutrientes adequados para otimizar a saúde e adicionando-se ingredientes com propriedades funcionais às formulações, agrega-se não só custo, mas também qualidade a este alimento. Por este motivo, os alimentos são atualmente separados em categorias de acordo com critérios, em geral qualitativos, para orientar ocliente no momento da compra, pro meio da chamada segmentação de mercado, na qual os alimentos são classificados em quatro diferentes fam´pilias: básico ou econômico; tandard ou popular; premium; superpremium. Mas quais seriam estes critérios para a classificação e como eles chegam ao conhecimento público?
Algumas dúvidas, não só dos proprietários no momento da compra, mas também dos próprios vendedores de ração, tornam necessário maior esclarecimento com relação ás noções de qualidade de um alimento. Estas dúvidas concentram-se principalmente nos níveis de garantia declarados nos rótulos, qualidade dos ingredientes, segurança alimentar, benefícios à saúde, que alimento fornecer para cada animal, idoneidade da empregas fabricante e condições de embalagem e estocagem.
Com relação aos níveis de garantia, nossa legislação obriga o fabricante a incluir os seguintes itens: umidade (máximo %); proteína bruta (mínimo %); extrato etéreo ou gordura (mínimo %); fibra bruta (máximo %); matéria mineral (máximo %); cálcio (mínimo/máximo %) e fósforo (mínimo %). Portanto, quando o cliente lê um rótulo de ração, ele sabe que o produto comprado está dentro destas especificações. Mas como traduzir isto para qualidade?
Todos aqueles elementos declardos como mínimo no rótulo devem estar igual ou acima do valor declarado e aqueles declarados como máximo devem apresentar-se em concentrações iguais ou abaixo das declaradas. De uma maneira geral, á medida que se melhora a qualidade da ração, os teores de proeína bruta e extrato etéreo tendem a aumentar e os teores de fibra bruta e matéria mineral tendem a diminuir. Isto porque a fibra e minerais muito elevados em uma ração reduzem sua digestibilidade, ou seja, a disponibilidade dos nutrientes deste alimento para o animal. Isto ocorre, pois subprodutos de origem animal de pior qualidade, apresetam maiores concentrações de minerais, especialmente cálcio e fósforo, o que faz com que haja esta relação entre o custo da ração e teores de minerais e fibra. Mas a fibra do alimento não deve ser conceituada como ruim, pois apesar de interferir na digestão, dependendo da qualidade da fonte empregada, pode melhorar a qualidade das fezes e reduzir a energia do alimento destinado a manter ou perder peso, sendo benéfica neste aspecto. Por este motivo, é importante verificar que fontes de fibra são empregadas na formulação, o que pode ser verificado pela listagem de ingredientes.
Ao contrário da fibra e matéria mineral, a gordura em geral apresenta uma digestão e também palatabilidade muito elevadas, o que, com a elevação nas concentrações nos alimentos, aumenta adigestão, energia do dalimento e propicia menores volumes fecais. No entanto, alimentos muito ricos em gordura, apesar de apresentarem estas caracterísitcas boas, devem ser fonecidos cautelosamente aos animais, pois favorecem o consumo e podem levar a obesidade, caso o proprietário não controle adequadamente a quantidade fornecida.
Com relação à proteína, quantidade nem sempre é sinônimo de qualidade e a utilização de elevados terores de proteína, que apresentam baixa disponibilidade para o animal, podem levar a produção de fezes mal formadas e com odor desagradável e a deficiências marginais de aminoáciodos para o animal, que podem comprometer a qualidade da pelagem, função imunológica e massa muscular do animal, entre outros. Por este motivo, quando olahamos ons níveis de garantia de um alimento, devemos associar esta informação com a relação de ingredientes listados na composição básica do produto.
Não se pode esquecer, ainda, de um aspecto de extrema importância em um rótulo de ração, onde estão informações muito valiosas, que é o "enriquecimento por quilograma de produto", listado geralmente próximo aos níveis de garantia. Nesta lista encontram-se as principais adições de minerais e vitaminas, que apresentam funções indispensáveis no organismo. O que se observa, de acordo com a segmentação de mercado, por se tratar de ingredientes em geral com custo mais elevado, é que os alimentos de baixo custo apresentam adição muito próxima da mínima recomendada para as espécies, enquanto os alimentos de melhor qualidade, tais como premium e superpremium, apresentam níveis seguros, mais afastados dos mínimos, o que favorece a saúde do animal, pois considera com isto as 0erdas de algumas vitaminas durante o processamento do alimento e estocagem, al´-em da adição de alguns minerais tais como zinco, selênio e cobre, entre outros, em níveis muito superiores aos mínimos recomendados, visando a melhorar a qualidade da pelagem, reduzir a produção de radicais livres, melhorar a resposta imunológica, metabolismo de nutrientes, entre outros. Da mesma forma que a proteína, a adição de vitaminas e minerais dependerá da fonte alimentar utilizada, pois o aproveitamento pelo animal está relacionado à biodisponibilidade da fonte empregada.
Com relação aos ingredientes empregados na ração, a qualidade é tão importante quanto a quantidade adicionada. Pensando em qualidade, deve-se considerar os aspectos nutricionais dos ingredientes e também as contaminações, que muitas vezes podem levar o animal à morte em caso da utilização de ingredientes ruins. Podem-se citar as toxinas produzidas por fungos (micotoxinas), melamina, peroxidação lipídica de ingredientes (rancificação), contaminhações microbiológicas por salmonelas e coliformes fecais, entre outros. Existe uma quantidade muito grande de ingredientes disponíveis para a utilização em formulação de alimentos para animais de companhia e, à medida que se procura melhorar a formulação, o custo dos ingredientes tende a aumentar paralelamente, pois a qualidade de um ingrediente dependerá das condições de processamento e da sua origem. Uma grande quantidade de subprodutos de origem animal e vegetal (farinha de aves, farinha de carne, carne mecanicamente separada, farelo de soja quirera de arroz, farelo de trigo, entre outros) é empregada nos alimentos. No entanto, ao contrário do que se pensa, muitos destes subprodutos apresentam valor biológico e/ou digestibilidade bons. O problema encontrado com as rações de baixo custo é que ao mesmo tempo em que se utilizam níveis nutricionais inferiores, os ingredientes também apresentam digestão ruim, o que pode prejudicar a sáude do animal.
Tendo em vista que a digestão do alimento está relacionada com a qualidade dos ingredientes empregados na formulação, a Associação Nacional de Fabricantes de Alimentos para animais de companhia (ANFALpet), tem procurado criar padrões de qualidade para os alimentos por segmento comercial, baseando-se em resultados de digestibilidade de cada produto. Desta forma, sugere-se que alimentos dos segmentos popular, premium e superpremium apresentem pelo menos 70%, 75% e 80% de digestão da matéria seca ingerida, respectivamente. Para a proteína, estes valores são semelhantes e para a gordura são respectivamente de 80%, 85% e 90%. Pode-se perceber que, à medida que se melhora a qualidade, o aproveitamento do alimento também aumenta, o que se reflete não só na saúde, mas também na produção de menor volume de fezes pelos aniamis. Para alimentos econômicos, estes parâmetros não são definidos, mas o que se percebe é que devido ao baixo custo, estes produtos geralmente apresentam também digestão e palatabilidade inferiores. Apesar disto, 65% do volume de vendas de pet food no Brasil é proveniente do segmento econômico.
À medida que se agrega valor a um alimento para animais de companhia, aumenta-se o foco na utilização da natrução para prevenir doenças, melhorar a qualidade de vida e aumentar a longevidade dos animais. Neste sentido os nutrientes e alimentos funcionais têm ganhado mais importância nos últimos anos. São exemplos disto algumas fontes de fibra (polpa de beterraba, extrato de yucca, celulose, entre outros), prebióticos (frutooligossacarídeos, manonoligossacarídeos), probióticos (Lactobacillus spp., Bifidobacterium spp.), controdoprotetores (glicosamina e condroitina), imunoestimulantes (glutamina, ácidos graxos poliinsaturados, entre outros), antioxidantes (luteína, vitaminas C e E, selênio, extratos vegetais, entre outros), reguladores metabólicos (carnitina), dentre outras muitas substâncias com estas propriedades. Alguns destes ingredientes podem chegar a custar algo em torno de R$ 300/kg, o que justifica muitas vezes a elevação do custo de alimentos quando se aumenta suas propriedades funcionais. À medida que melhora a qualidade do alimento, o que observamos é que um alimento superpremium apresenta mais propriedades funcionais, quando comparado a um alimento popular, por exemplo.
Finalmente, existem alguns aspectos que devem ser considerados no momento da escolha de um alimento, que são a qualidade da embalagem e a idoneidade da empresa fabricante do alimento em questão. Com relação á embalagem, esta apresenta como principal função a manutenção das características originais do produto (cor, odor, aspecto, textura). Desta forma, o custo da mesma também é diretamente proporcional à qualidade do alimento que está envolvendo, tendo em vista aimportância para a empresa, de que o produto fabricado mantenha suas características até ser consumido pelo animal. Por este motivo, alimentos de melhor qualidade tendem a se apresentar em embalagens completamente vedadas ou até mesmo a vácuo ou sob condições de baixa tensão de oxigênio (atmosfera modificada). Este tipo de embalagem, além de favorecer a manutenção da qualidade do produto (evitar perdas de nutrientes e oxidação), mantém o alimento atrativo para o animal por um tempo maior.
Por último, devemos ressaltar que a fiscalização dos estabelecimentos comerciais no Brasil ainda é um pouco deficiente e, por este motivo, o consumidor deve procurar-se informar melhor sobre a empresa que fabrica o alimento para seu cão ou gato, uma vez que alguns fatores, como qualidade da matéria-prima, processo de fabricação, responsabilidade sócio-ambiental e fiscal, bem -estar e treinamento dos funcionários e qualidade do serviço de atendimento ao consumidor (SAC), são aspectos muito importantes a se considerar na escolha de uma ração.
Frente a inúmeras empresas e marcas disponíveis no mercado brasileiro pssuindo rações das mais diferentes qualidades, cabe ao proprietário, com a ajuda do médico veterinário de sua confiança, decidir, baseando-se em todos os conceitos aqui listados, qual o alimento comercial que será mais adequado para o seu animal de estimação.